quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Mistérios temporais



 Pensava, mas a ideia de postagem não se realizava em plenitude.  Depois que pensei um pouco sobre plenitude, refleti na postagem anterior, postagem que falava sobre a pirâmide de Maslow.  As indagações foram as seguintes: qual é a base do meu conhecimento? Qual assunto passaria o dia conversando sem cansar?
 
 Em um intervalo de indagação, recebi uma mensagem: palavras de Clarice Lispector.  A mensagem dizia: “Ainda bem que existe outro dia. E outros sonhos. E outros risos. E outras pessoas. E outras coisas.” Minha resposta de imediato foi dizer: ainda bem que existiu Clarice.
 As palavras de Clarice, citadas acima, abrem possibilidade de um conforto futuro. Mas será que há sempre possibilidade para um nascer de outro dia, um nascer de um novo sonho, um nascer de uma nova realidade ou de uma nova pessoa? Qual é o perigo de criar expectativas? Provavelmente, a problemática da expectativa seria a não realização do esperado. Mas seria apenas isso? E quando recebemos aquilo que tanto desejamos e damos mais importância de outrora, não seria um problema também? E quando aquilo que desejávamos no passado, indiferenciado no presente e perdido um tempo subsequente se liquefaz?
 Futuro, presente e passado é um dos tripés mais utilizados na nossa existência. Somos seres de criação de expectativas, convivências e rupturas. A criação da expectativa oferece o acesso para o novo. A covivência pode tornar a vida simples demais. A ruptura sugere que o banal era de extrema importância na minha construção.  
Será que o mistério da vida é viver nessa fragmentação de tempo futuro, presente e passado?

Querer ter o que não se tem.
Desprezar o que se tem.
ter arrependimento pela perda do que se tinha.

É preciso viver para saber. Será que terei possibilidade no amanhã? O que teu passado informa? Descubra o seu mistério. Você não precisa de código para acessar a sua própria. Será?






Visão de Clarice -  Carlos Drummond de Andrade.

Clarice
veio de um mistério, partiu para outro.

Ficamos sem saber a essência do mistério.
Ou o mistério não era essencial. Essencial
era Clarice viajando nele.

Era Clarice bulindo no fundo mais fundo,
onde a palavra parece encontrar
sua razão de ser, e retratar o homem.

O que Clarice disse, o que Clarice viveu para nós
em forma de história
em forma de sonho de história
em forma de sonho de sonho de história
(no meio havia uma barata ou um anjo?)
não sabemos repetir nem inventar.
São coisas, são joias particulares de Clarice,
que usamos de empréstimo, ela é a dona de tudo.

Clarice não foi um lugar-comum.
carteira de identidade, retrato.
De Chirico a pintou? Pois sim.
O mais ouro retrato de Clarice
só se pode encontrá-lo atrás da nuvem
que o avião cortou, não se percebe mais

De Clarice guardamos gestos. Gestos,
tentativas de Clarice de sair de Clarice
para ser igual a nós todos
em cortesia, cuidados matarias.
Clarice não saiu, mesmo sorrindo.
Dentro dela
o que havia de salões, de escadarias,
de tetos fosforescentes e longas estepes
e zimbórios e pontes do Recife em bruma envoltas
formava um país, o país onde Clarice vivia, só e ardente, construindo fábulas.

 Não podíamos reter Clarice em nosso chão
salpicado de compromissos. Os papéis,
os cumprimentos falavam em agora
em edições,possíveis coquetéis
á beira do abismo.
Levitando acima do abismo Clarice riscava
um sulco rubro e cinza e fascinava-nos.

Fascinava-nos, apenas.
Deixamos para compreendê-la mais tarde.
Mais tarde, um dia... saberemos amar Clarice.






 Postado por Alan Nascimento